segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

O PRIMEIRO SEGUNDO

Cândido Pinheiro



Use todas as pontes para chegar
e todas as chaves para abrir
Use o sorriso para colorir
e o olhar para iluminar.

Use todas as energias para vibrar
e o coração para amar
Use as palavras para agradecer
e os braços para aconchegar.

Use a imaginação para criar
e todas as esperanças redobrar
Use o perdão e a tolerância 
no Ano que vai chegar.

Use o primeiro segundo
e encontre-se consigo mesma
Use a beleza de teu espírito
para ao Novo Ano brindar.


FELIZ ANO NOVO!

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Trecho do Livro QUINCAS BORBA

Machado de Assis


Enquanto uma chora, outra ri;
é a lei do mundo, meu rico senhor; 
é a perfeição universal. 
Tudo chorando seria monótono, 
tudo rindo cansativo; mas uma boa distribuição
de lágrimas e polcas, 
soluços e sarabandas, 
acaba por trazer à alma do mundo a variedade necessária, 
e faz-se o equilíbrio da vida...

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

CAIXINHA MÁGICA

Roseana Murray


Fabrico uma caixa mágica
para guardar o que não cabe
em nenhum lugar: 
a minha sombra
em dias de muito sol,
o amarelo que sobra
do girassol,
um suspiro de beija-flor,
invisíveis lágrimas de amor.

Fabrico a caixa com vento,
palavras e desequilíbrio,
e para fechá-la
com tudo o que leva dentro,
basta uma gota de tempo.

O que é que você quer
esconder na minha caixa? 

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

FELICIDADE

Bruno de Paula



São pequenos pedaços de ventos
Que nunca nos chegam como eternos.
Muitas vezes ...
Chegam com a quietude do pôr-do-sol.
Ao qual temos que estar atentos
Para desfrutar o efêmero
Em sua plenitude ...

AQUARELA

Cida Luz

Não me faça ser alardes
de emoções.
O que aconchego 
no peito são sentimentos 
tão meus,
tão sem rótulos falsos,
sentimentos genuínos 
apenas...
Não me faça gritar 
o amor...
Eu o sinto silenciosamente
para não que não surjam
borrões de amarguras...
Não sou julgamentos,
talvez inquieta na expectativa
de novos acontecimentos.
Sou mesmo a tela em branco
esperando a sensibilidade da
aquarela de um coração 
qualquer.
Sou mesmo assim...

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

AMOR EM VERSOS

Bruno de Paula



O amor não se define.
Não cabe em palavras.
Amor é um afago,
Ladeado de procura.

Amor é um coração em eco,
Pulsando sem ritmo.
Um olhar cego.
A ternura de um sorriso.

O amor é a alma que fala.
Poema que não acaba.
Gestos que não se aprende.
É tudo, nunca um pouco.

O amor é vida.
É o universo em sonho.
É vento num labirinto,
Onde perdido ... Me encontrei

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

INSTANTES

Carla Marisa Pereira


Nunca menos, nunca mais,
na exata medida do que me espera,
do que não vendo, perco na vida,
do que esperando, sonho acordada,
do que vivendo, me encho de ser.

Aquele instante, não outro,
o perfume no meio da rua,
o cão atravessando na passadeira,
o raio de sol aquecendo o banco de jardim,
o pé cansado de andar,
a mente ainda querendo ver mais.

Sozinha, em meio à multidão,
ninguém me conhece,
nem sei se alguém me vê
sinto-me entregue a mim mesma,
dona de meus minutos,
do que me vai no peito,
do que se forma em meu pensamento,
do que de mim se desenrola,
inédito, ininterrupto e inexplicável,
ante meus olhos, olhando para dentro
e sem mostrar nada a ninguém.

Não faço parte do mundo,
o mundo é que faz parte de mim.


JARDIM INTERIOR

Mario Quintana



Todos os jardins deviam ser fechados,
com altos muros de um cinza muito pálido,
onde uma fonte
pudesse cantar
sozinha
entre o vermelho dos cravos.
O que mata um jardim não é mesmo
alguma ausência
nem o abandono...
O que mata um jardim é esse olhar vazio
de quem por eles passa indiferente.

domingo, 5 de agosto de 2012

ETERNAMENTE

Gal Costa


Só mesmo o tempo
Pode revelar o lado oculto das paixões
O que se foi
E o que não passará
Inesquecíveis sensações
Que sempre vão ficar
Pra nos fazer lembrar
Dos sonhos, beijos
Tantos momentos bons
Só mesmo o tempo
Vai poder provar
A eternidade das canções
A nossa música está no ar
Emocionando os corações
Pois tudo que é amor
Parece com você
Pense, lembre
Nunca vou te esquecer
Vou ter sempre você comigo
Nosso amor eu canto e cantarei
Você é tudo que eu amei na vida
Nunca vou te esquecer.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

QUEBRA-CABEÇA

Martha Medeiros 



Não passam as dores, também não passam as alegrias. 
Tudo o que nos fez feliz ou infeliz, 
serve pra montar o quebra-cabeça da nossa vida, 
um quebra-cabeça de cem mil peças. 
Aquela noite que você não conseguiu parar de chorar, 
aquele dia que você ficou caminhando sem saber para onde ir, 
aquele beijo cinematográfico que você recebeu, 
aquela visita surpresa que ela lhe fez, o parto do seu filho, 
a bronca do seu pai, a demissão injusta, 
o acidente que lhe deixou cicatrizes, tudo isso vai, 
aos pouquinhos, formando quem você é. 
Não há nenhuma peça que não se encaixe. 
Todas são aproveitáveis. Como são muitas, 
você pode esquecer de algumas, 
e a isso chamamos de "passou". Não passou. 
Está lá dentro, meio perdida, mas quando você menos esperar, 
ela será necessária para você completar o jogo e se enxergar por inteiro.

SE O AMOR PUDESSE

Vinicius de Moraes



Se o amor pudesse de repente compreender
Toda loucura que um amor pode conter
Se ele pudesse, num momento de razão
Saber ao menos quanto dói uma paixão
Quem sabe o amor, ao descobrir a dor de amar  
Partisse embora para nunca mais voltar
Mas me parece que uma prece ia nascer
Na voz daqueles que o amor mais fez sofrer
A lhe dizer que vale mais morrer de dor
Do que viver num paraíso sem amor.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Durma Noite Sem Sono

Raf Dono

Dorme noite vazia
foge o drama da terra adormecida
sopre o doce em sua face
feche seus olhos agora
nesta noite do cavalgar

Quero mais é te encontrar no mar
quero mais é te levar para as dunas do vale morto
quero mais é te afogar neste abismo cheio de sono

sexta-feira, 29 de junho de 2012

FELICIDADE É COISA QUE NÃO TEM

Judas Isgorogota

Era órfã e infeliz. Tinha o pesar profundo
De ser só, de não ter, como as outras meninas,
O carinho, a atenção, o desvelo dos pais.
Sofria por saber que, sozinha no mundo,
Ela, que havia tido a mais negra das sinas,
Deste mundo de dor nada esperava mais...
Mas, ouvindo, por fim, a fervorosa prece
Que altas horas da noite entre prantos brotava
Daquele ingênuo coração,
O Senhor a atendeu. E eis que um dia aparece
Um casal que de há muito desejava
Uma menina assim, para sua afeição.
E ela foi a sorrir, ela que não sorria...
A mansão do casal era toda cercada
De um mimoso jardim.
Seus vestidos agora eram lindos. Dir-se-ia
Que a andrajosa infeliz se transmudara em fada
E que a sua desdita, enfim, tivera um fim...
Não tivera, porém. Há três anos
Que ela era na escola a estudante pior.
Entanto, ela fazia esforços sobre-humanos
Para ao menos dizer uma frase de cor...
A memória, porém, só lhe causava danos
E era aquilo, afinal, sua mágoa maior...
Uma noite, o casal lhe disse: "Temos pena
De lembrar que você já não é tão pequena,
Que precisa estudar...
Pois, se perder este ano, é coisa resolvida,
Você vai passar a sua vida
Na copa, a trabalhar."
Aquela repreensão como um punhal lhe doía.
Tendo a alma a afogar-se em pranto, noite e dia
Aos livros a sem-sorte inda mais se aplicou.
Não, não queria ser uma simples copeira,
Ela que, pobrezinha, a sua infância inteira
Entre angústias passou...
Dezembro. A criançada. Antegozando as férias,
Mui longe de pensar nessas coisas tão sérias
Que a vida nos impõe quando a idade já vem,
Corre aos exames, rindo a criançada...
E no meio daquela revoada
Com um riso triste e bom, a órfão sorri também...
A escola é nesse dia um ninho delicioso,
Forrado de jasmins, de palmas e florões.
E a voz do mestre é a voz de um Todo-poderoso
Que as almas infantis enche de comoções...
Chega a vez da orfãzinha. É agora a vez terceira
Que se senta naquela humílima cadeira
Tal como se sentasse em um banco de réu...
Fala o mestre o seu nome, ao que ela diz: "Presente!"
Mas, o corpo era só que estava ali...realmente,
A sua alma vagava, entre os anjos, no céu...
O mestre a conhecia: era uma retardada
Mental, um caso à parte, e mister se fazia
Que com amor procedesse à mais leve argüição.
Dentre todas talvez fosse a mais aplicada...
Mas a idéia faltava...o cérebro dormia...
E a memória vivia em profunda inação.
-"Minha filha, você sabe perfeitamente
O que é "substantivo": a palavra que indica
Um animal, um ente,
Uma coisa ou pessoa, ou mesmo uma ilusão...
Por exemplo, você, o seu nome, "Lilica";
"Palácio", "Deus", "Amor", "Jornal", "Antônio"...
"Demônio" é um ser também, muito embora "Demônio"
Somente exista na imaginação..."
-"Muito bem, - prosseguiu o mestre. Estou contente.
Agora, diga o que é "substantivo abstrato"...
Diga...Lembre-se bem...coisa mais fácil não há...
Substantivo abstrato...uma coisa em que a gente
Ouve sempre falar mas não viu, de fato,
Nunca viu nem verá..."
-"Vamos... Só um exemplo, e eu fico satisfeito...
Substantivo abstrato...um entre sobre-humano,
Um ser a cujo canto alma alguma resiste,
Mas que não passa de ilusão...
Um sentimento bom que vive em nosso peito...
Uma coisa que o mundo inteiro diz que existe
E entretanto jamais a tivemos à mão..."
Nesse instante, uma luz brilhou nos olhos pequeninos
Da orfãzinha infeliz; e eis que, rasgando o denso
Nevoeiro, a idéia acorda em lampejos divinos,
A memória reluz como uma estranha vela;
Inicia a razão sua marcha triunfal,
E o cérebro, por fim, despertando daquela
Sonolência fatal,
Começa a funcionar com um dínamo imenso!
-"Mestre...mestre...eu já sei!" – grita a coitada como
Temendo que a razão se apagasse outra vez.
E aos brados, a chorar, num doloroso assomo,
Grita como uma douda
Que quisesse dizer a sua angústia toda
Naquele instante só de estranha lucidez!
- "Mestre, eu sei o que é! Se há uma coisa, em verdade,
Que o mundo inteiro diz que existe e que ninguém
Conseguiu ver jamais, nem a sentiu também,
Essa coisa só pode ser "Felicidade"!
Felicidade é coisa que não tem"!

domingo, 8 de abril de 2012

AUSÊNCIA

Vinícius de Moraes



Eu deixarei que morra em mim o desejo
de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa
de me veres eternamente exausto
No entanto a tua presença é qualquer coisa
como a luz e a vida.


E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto
e em minha voz a tua voz
Não te quero ter porque
em meu ser está tudo terminado.
Quero só que surjas em mim
como a fé nos desesperados.


Para que eu possa levar uma gota de orvalho
nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne
como uma nódoa do passado.
Eu deixarei ... tu irás e encostarás
a tua face em outra face.


Teus dedos enlaçarão outros dedos
e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu,
porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei a minha face
na face da noite e ouvi a tua fala amorosa.


Porque meus dedos enlaçaram os dedos
da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência
do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só
como os veleiros nos portos silenciosos.


Mas eu te possuirei mais que ninguém
porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar,
do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente,
a tua voz serenizada.


sábado, 7 de abril de 2012

A VIAGEM NÃO ACABA NUNCA

José Saramago



A viagem não acaba nunca. Só os viajantes acabam. 

E mesmo estes podem prolongar-se em memória, 
em lembrança, em narrativa. 
Quando o visitante sentou na areia da praia e disse:
“Não há mais o que ver”, saiba que não era assim. 
O fim de uma viagem é apenas o começo de outra. 
É preciso ver o que não foi visto, 
ver outra vez o que se viu já, 
ver na primavera o que se vira no verão, 
ver de dia o que se viu de noite, 
com o sol onde primeiramente a chuva caía, 
ver a seara verde, o fruto maduro, a pedra que mudou de lugar, 
a sombra que aqui não estava. 
É preciso voltar aos passos que foram dados, 
para repetir e para traçar caminhos novos ao lado deles. 
É preciso recomeçar a viagem. 
Sempre.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

SAUDADE

Pablo Neruda




Saudade é solidão acompanhada, 
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...

Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,
é não ver o futuro que nos convida...

Saudade é sentir que existe o que não existe mais...

Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...

Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.

E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.

O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.


domingo, 1 de abril de 2012

A VOZ DO SILÊNCIO

Martha Medeiros




Pior do que a voz que cala,
é um silêncio que fala.

Simples, rápido! E quanta força!

Imediatamente me veio à cabeça situações
em que o silêncio me disse verdades terríveis,
pois você sabe, o silêncio não é dado a amenidades.
Um telefone mudo. Um e-mail que não chega.
Um encontro onde nenhum dos dois abre a boca.

Silêncios que falam sobre desinteresse,
esquecimento, recusas.

Quantas coisas são ditas na quietude,
depois de uma discussão.
O perdão não vem, nem um beijo,
nem uma gargalhada
para acabar com o clima de tensão.

Só ele permanece imutável,
o silêncio, a ante-sala do fim.

É mil vezes preferível uma voz que diga coisas
que a gente não quer ouvir,
pois ao menos as palavras que são ditas
indicam uma tentativa de entendimento.

Cordas vocais em funcionamento
articulam argumentos,
expõem suas queixas, jogam limpo.
Já o silêncio arquiteta planos
que não são compartilhados.
Quando nada é dito, nada fica combinado.

Quantas vezes, numa discussão histérica,
ouvimos um dos dois gritar:
"Diz alguma coisa, mas não fica
aí parado me olhando!"

É o silêncio de um, mandando más notícias
para o desespero do outro.

É claro que há muitas situações
em que o silêncio é bem-vindo.
Para um cara que trabalha
com uma britadeira na rua,
o silêncio é um bálsamo.
Para a professora de uma creche,
o silêncio é um presente.
Para os seguranças de um show de rock,
o silêncio é um sonho.

Mesmo no amor,
quando a relação é sólida e madura,
o silêncio a dois não incomoda,
pois é o silêncio da paz.

O único silêncio que perturba,
é aquele que fala.

E fala alto.

É quando ninguém bate à nossa porta,
não há emails na caixa de entrada
não há recados na secretária eletrônica
e mesmo assim, você entende a mensagem.


quinta-feira, 29 de março de 2012

POEMA DESENHADO

Mario Quintana


No meio da página escrevo por acaso a palavra MENINA
e, à sua magia, um caminho abre-se
para ela andar

E como houvesse brotado a seus pés um arroio espiador,
uma ponte estendeu-se
para ela atravessar

Mas a menina
agora parou
e do meio da ponte namora encantadamente nas águas
a graça inacabada de seu pequenino rosto feito às pressas

Às pressas...
(nem tive tempo de lhe dar um nome)

A vida é assim
Meninazinha sem nome...

A vida nem da tempo para a Vida!

VENDAVAL

Fernando Pessoa




Ó vento do norte, tão fundo e tão frio,
Não achas, soprando por tanta solidão,
Deserto, penhasco, coval mais vazio
Que o meu coração!


Indômita praia, que a raiva do oceano
Faz louco lugar, caverna sem fim,
Não são tão deixados do alegre e do humano
Como a alma que há em mim!


Mas dura planície, praia atra em fereza,
Só têm a tristeza que a gente lhes vê;
E nisto que em mim é vácuo e tristeza
É o visto o que vê.


Ah, mágoa de ter consciência da vida!
Tu, vento do norte, teimoso, iracundo,
Que rasgas os robles - teu pulso divida
Minh'alma do mundo!


Ah, se, como levas as folhas e a areia,
A alma que tenho pudesses levar -
Fosse pr'onde fosse, pra longe da idéia
De eu ter que pensar!


Abismo da noite, da chuva, do vento,
Mar torvo do caos que parece volver -
Porque é que não entras no meu pensamento
Para ele morrer?


Horror de ser sempre com vida a consciência!
Horror de sentir a alma sempre a pensar!
Arranca-me, ó vento; do chão da existência,
De ser um lugar!


E, pela alta noite que fazes mais escura,
Pelo caos furioso que crias no mundo,
Dissolve em areia esta minha amargura,
Meu tédio profundo.


E contra as vidraças dos que há que têm lares,
Telhados daqueles que têm razão,
Atira, já pária desfeito dos ares,
O meu coração!


Meu coração triste, meu coração ermo,
Tornado a substância dispersa e negada
Do vento sem forma, da noite sem termo,
Do abismo e do nada!


quarta-feira, 28 de março de 2012

DO UNIVERSO À JABUTICABA

Rubem Alves



Minha vida se divide em três fases.
Na primeira, meu mundo era do tamanho do universo
E era habitado por deuses, verdadeiros e absolutos.
Na segunda fase meu mundo encolheu,
ficou mais modesto e passou a ser habitado
por heróis revolucionários que portavam armas
e cantavam canções de transformar o mundo.
Na terceira fase, mortos os deuses,
mortos os heróis, mortas as verdades e os absolutos,
meu mundo se encolheu ainda mais
e chegou não à sua verdade final
mas a sua beleza final:
ficou belo e efêmero como uma jabuticabeira florida.